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quarta-feira, novembro 10, 2010

Dona Marinhinha: Uma artesã anônima de Canindé




Quem conhece a história de Dona Marinhinha? Pois é:

Maria Ricardo dos Santos, mais conhecida como Dona Marinhinha da cabeça do Negô, tem 89 anos, teve 16 filhos, 14 vivos. Filha de Canindé de São Francisco, nasceu na fazenda Cuiabá, hoje assentamento com o mesmo nome. Nunca saiu do município (Continuar lendo)
e para manter a sobrevivência, dura sobrevivência do sertanejo, fez de tudo na vida como ela mesma fala: “para ajudar no sustento da família eu fazia de tudo, plantava roça, fazia carvão, carregava feixes lenha nas costas, pescava pitu para vender por dúzia, trabalhava de machado, era costureira, fazia sabão da terra e por fim comecei a fazer panelas de barro por encomenda, que eu aprendi por mim mesma.”
Em meio a tudo isso que Dona Marinha fez está uma grande arte que, ao menos aqui na região, parece estar se dizimando, acabando indo embora sem deixar sucessores: a arte de fazer panela de barro. Uma cultura que não existe olhos para ela; sem incentivo, que não é dado o valor cultural, social e humano que deveria ter. A começar da própria casa de Dona Maria, pois, ninguém quis aprender a arte de confeccionar as panelas, potes, etc. .

Dona Marinha fazia várias peças diferentes: taxo para mexer pirão e outras finalidades, agridao para lavar mãos, potes, jarras, pratos de vários tipos e formatos, cachimbos, bacias de rosto, etc. Nessa época, 60 anos atrás, o alumínio e o plástico aqui era difícil, diz ela, e além do mais pouca gente podia comprar, daí vinham as encomendas e eram feitas as peças.
O trabalho da confecção era árduo, desde a procura pelo barro melhor, passando pelo tipo de madeira para queimar (umburana), confecção e acabamento. Chegava a fazer 10 peças em uma semana, mais as vezes até 6 ao dia. Dependia do tamanho da peça e da auto estima pessoal. O estado de espírito contava muito, pois a vida aqui era dura, diz ela e não era fácil naquela época.
Hoje a panela de barro é objeto de ornamentação em hotéis, restaurantes, centros de artes e em lugares de grande luxo. Enfeitam mesas nos melhores restaurantes do estilo rústico ao mais clássico. Dão um toque bem especial na composição de uma mesa, jardim, fachada. Hoje existe até um público especial para elas. Esses objetos ganharam ascensão social, financeira, decorativa, de coleção bem elitizadas. Imagine. Não guardou quase nada de suas peças , apenas alguns potes.
Bonitas e simples como são, servem para tudo e assenta com os mais variados serviços de prato, não perdendo para baixelas de ouro nem de prata que, aliás, esses elementos são seus parentes bem próximos na carga dos elementos naturais. È muito comum se servir em panelas de barro a peixada, moqueca, sururu, buchada, feijoada e por ai vai. A panela de barro é uma peça que chama a atenção. Pela importância cultural que tem, deveria tentar, aqui na região, através da promoção da cultura, não deixar esta arte se acabar e tentar se promover até curso como forma de resgate cultural.
Uma única peça chegava a demorar cerca de 3 horas, depois colocada no fogo (forno) e esperava-se “dar o ponto”. Penso, até, que poderia servir de ensinamento e terapia para idosos e outros interessados. É interessante que o corpo do idoso tenha atividades físicas, dança, mais, é preciso valorizar a mente, se não ele esquece com facilidade, justamente pela pouca força do habito de raciocinar e mesmo o simples gesto de pensar. Uma peça, há época, era vendida por 2.000 contos. Até hoje Dona Marinhinha se diz com disposição para muita coisa, reclama um pouco da vista. Diz que uma comida feita na panela de barro tem um gosto diferente é bem mais gostoso, principalmente se cozida a fogo de lenha.
Dona Marinha, com o saber acumulado que tem, daria uma ótima professora para idosos e a tradição seria passada adiante, estaria viva. Seria bom, penso.
Em toda a sua vida Dona Marinhinha diz que produziu muitas peças e perde a conta de quantas fez: mais de 1000. Muita gente encomendava e chagava até a não dar conta de tanta encomenda. Outro oficio que Dona Marinhinha aprendeu só foi a confecção do sabão que se chamava: sabão da terra. Feito rusticamente de sebo de boi, cinza, água e muito trabalho. Era igualmente encomendado e não dava para quem queria e encomendava.
Quando os trabalhos de construção da usina XIngó estavam chegando ao final uma equipe de arqueólogos, lideradas pela Doutora Cleionice, vieram fazer escavações no local onde ficava o povoado Cabeça do Nego e lá encontraram diversas peças de barro e essas foram levadas para o MAX: Museu de Arqueologia do Xingó, aqui em Canindé e estão lá, em exposição até hoje. Vale a pena visitar.
Foi com a argila, barro, que o homem se comunicou pela primeira vez, traçando uma linguagem simbólica. Em algumas teorias diz-se que o homem provem do barro, da terra e é certo que para terra voltará. O adão da bíblia foi moldado de algo semelhante ao barro. Os pergaminhos, na antiguidade, eram guardados em potes de barro; no Egito antigo, os potes tinham valor de ouro. A história está cheia de referências a argila e a sua valorosa contribuição na vida do homem até os dias de hoje é de grande importância.
Dona Marinhinha fez a sua parte e deu, grande contribuição para a historia, cultura, economia e humanitário de Canindé de São Francisco. È uma moeda de valor inestimável, para os que entendem isso. Além de ser octogenária e de ter dado a Canindé uma prole enorme que, entre filhos, netos, genros e noras, somam-se ai uma família com mais 60 pessoas.
Se iguala a Zé Leobino e outros que valem o mesmo peso de ouro e merecem o mesmo reconhecimento do valor histórico e cultural da região.
47 anos, é a idade de um dos potes que ela fez e está na sua casa guardando água e matando a sede de filhos, netos e de quem mais aparecer por lá. Prova viva da sua arte para quem quiser ver.

Matéria autorizada por Dona Marinhinha e Familiares


FONTE REVISTACANINDE.BLOGSPOT.COM
JORNALISTA ADEVAL MARQUES
EDIÇÃO E AUTORIZAÇÃO DE ADEVAL MARQUES


OBS ; NA PROXIMA EDIÇÃO DO JORNAL DO SERTÃO O MATERIAL SERÁ A PRINCIPAL MATERIA DA CAPA DE NOVEMBRO.

Um comentário:

Anônimo disse...

Jovem, critico, pensador, idealista, humanista. Adeval tá de parabens pelas suas matérias sobre vários assuntos e temas relevante para Canindé de São Francisco. Agora ele inova, mais uma vez ao seu estilo (indefinido), com essa batéria de matérias a respeito do povo de Canindé. È um talento nato e Canindé tá de parabens e Adeval sempre dando a volta por cima e o "trôco".
Prabens Cláudio por colocar essa homenagem a Dona Marinhinha no seu blog, quem ganha são todos de Canindé.

José Ventura, neto de Dona Marinhinha

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